Nota: forem jogar a Portalegre por MCV às 15:09 de 19 outubro 2013
Falsas memórias
Depois de me haver surpreendido com o efeito degenerescente que um aparelho de GPS pode exercer sobre o meu até então apurado sentido de orientação, surpreendo-me agora com outro efeito sobre o meu cérebro exercido pela observação de vistas do Google Street.
Já são duas surpresas em pouco tempo para um tipo que não está já em idade de se surpreender.
O facto é que a contemplação das vistas de rua e de estrada de locais que desconhecia gerou falsas memórias fotográficas reais. E, chegado aos sítios, esbateu em muito o deslumbramento que novas e interessantes vistas normalmente desencadeiam.
Gostei de ler alguns livros de merda. Cheios de erros ortográficos, fartos de erros de sintaxe, com uma lógica argumentativa ao nível de um cretino.
Gostei de os ler como quem (calculo que assim seja) gosta de teatro de revista. Uma coisa primária, sem expectativas para além do menor (chamem-lhe mínimo admissível).
Gostei de facto de ler alguns livros de merda. Ainda que se encontrassem pontuados de asneiras e disparates factuais – fosse o caso de Dom Afonso Henriques ser filho de Nuno Álvares Pereira fosse o caso de o grande terramoto de Lisboa ter ocorrido no Algarve trinta e três anos antes de 1755 (ninguém cá estava para ver). Isto para citar alguns erros que não encontrei, tendo encontrado outros de igual calibre.
Gostei até bastante de ler alguns livros de merda. Os que, no meio dos erros gramaticais, dos erros de discorrimento, dos erros factuais e dos erros de discernimento que aqui não exemplifiquei, mostram uma decoração argumentativa que se assemelha, pictoricamente, à dos carrosséis de feira dos anos 60.
Isso – que é sua leitura - é bom para um fim de tarde num dia de Verão, no momento em que a mudança da brisa produz os seus efeitos. por MCV às 23:40 de 18 outubro 2013
No final da década de 70, a crer nos ouvidos, havia bacanais por toda a parte.
Pois eu, pela parte que me tocou, posso dizer que os que frequentei tiveram a emoção e a luxúria de um pacato chá das cinco. Ou de uma demonstração tupperware aviltada pela presença de machos inquietos. Algo do género.
Ora ainda hoje ouço por vezes menções a tais festins. Ao teste de “estavas lá?” obtenho invariavelmente um “não, mas contaram-me”.
Não digo que não tenha havido tais festas. Acho estranho é não haver testemunhos na primeira pessoa. Ainda que fique bem omitir certas passagens do currículo. por MCV às 18:46 de 16 outubro 2013
Merece leitura atenta um resumo da teoria apresentada pelos vencedores do Nobel da Economia.
A questão do comportamento dos mercados é um dos mistérios que decorre do mistério do comportamento humano e dos actos de Deus (secas, aluviões, pestes, etc.).
Se alguém se aventura nessa senda com hipóteses que merecem um Nobel, há-de haver nesse resumo qualquer coisa que se aproveite.
Confesso que vou lê-lo com a reserva mental que aplico a todos os modelos que fazem previsões, se é disso realmente que se trata.
(clicar para aceder ao documento justificativo e descritivo do prémio) por MCV às 04:23 de 15 outubro 2013
Jornalismo
A primeira vez que ouvi e vi a notícia sobre o mais recente atropelo na Índia, a voz off dizia que tudo tinha tido origem no colapso de uma ponte. Todavia, as imagens mostravam gente a atropelar-se numa ponte erecta, sem danos visíveis.
A diferença desta vez é que corrigiram mais tarde o erro. Afinal tinha sido o boato de que a ponte iria cair que levou ao pânico.
É muito frequente que os textos lidos não acompanhem as imagens, dando a ideia de que quem escreveu o texto se limitou a traduzir dos textos das agências sem espírito crítico, sem ter visto as imagens ou, caso para me inclino, sem as ter compreendido.
E é muito raro que seja feita a correcção. por MCV às 16:44 de 14 outubro 2013
Retrato-robot
fotografia de Leon Neal para a AFP
To be or not to be – that clever to understand what are errors in a calculation.
Esta é a questão que se deve considerar quando se publicam os retratos inventados de alguém, com vista a que esse alguém seja reconhecido.
Ocorre-me isto quando surge mais uma torrente de notícias sobre a desaparecida Madeleine McCann, acompanhadas de um novo mas já velho retrato-robot do que alguém pretende seja a imagem da miúda actualmente. Se ainda estiver entre os vivos.
Aqui nem sequer há cálculo, qualquer ciência. É pura e dura arte divinatória. Alguém se entreteve a imaginar o aspecto da miúda, com base nos seus traços conhecidos e na fisionomia dos pais. Apesar de tudo, uma coisa provavelmente mais próxima do que a imagem de Jesus Cristo.
Ora a questão é se, sendo o fito o de encontrar viva, caso ainda o esteja, a miúda, é procedente emitir tal retrato de forma acrítica, para que os simples pensem que aquele é, de facto, o aspecto actual dela.
Ou se seria preferível não o fazer, dada a baixíssima probabilidade de tal retrato ter alguma parecença com a almejada realidade. por MCV às 20:52 de 13 outubro 2013